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Peng Xiangjie: “Tenda Errante” e o nomadismo do artista de circo

June 28, 2019

Peng Xiangjie: “Tenda Errante” e o nomadismo do artista de circo

Na série “Tenda Errante”, Peng Xiangjie acompanha grupos itinerantes de circo na China contemporânea. Entre os anos 1992 e 2002, o fotógrafo chinês percorreu várias zonas do país, incluindo as províncias de Gansu, Shanxi, Shaanxi e Mongólia Interior, com diferentes trupes de artistas. Nascido em Xi’an, Peng começou a dedicar-se à fotografia em 1991, quando decidiu registar o dia-a-dia e as cerimónias fúnebres de aldeias da província de Shaanxi, no centro do país. Ao longo dos anos, tem exposto em várias galerias e festivais internacionais e publicado em revistas como a National Geographic e a China Photography. Damos agora a conhecer no Extramuros esta série, numa colaboração que hoje começamos com o Photography of China, uma plataforma que olha para a China de várias perspectivas e pela lente de um mundo de fotógrafos que queremos conhecer.

Traduzimos aqui um texto de Monica Dematté, escrito em 2005, sobre o trabalho de Peng Xiangjie:

Peng Xiangjie 彭祥杰 é talvez a pessoa mais magra que conheci na minha vida. Ao tocar no seu ombro, tem-se a sensação de que se está a colocar a mão directamente num pedaço de ferro – a pele parece não existir. Mas este não é resultado de uma dieta deliberada. Ele está sempre a mastigar qualquer coisa e não limita de forma alguma o acesso à comida. Quando lhe perguntei se sempre foi assim, ele contou-me uma história dos tempos de juventude, quando um dia regressava do campo a Xi’an e apanhou boleia num camião. O motorista aproveitou uma pausa para o deixar para trás, forçando-o a passar a noite a andar, e a tremer, ao longo de uma estrada na montanha, só e em pânico. Quando finalmente chegou a casa, ficou doente e perdeu peso, que nunca mais recuperou depois dessa experiência.

Antes disso, ainda miúdo, fugiu de casa dos pais, que se tinham mudado de Dongbei para Shaanxi, e regressou a casa do avô, conseguindo aventurosamente encontrá-la. Para o fazer, levou a vida de uma criança sem-abrigo, sobreviveu com a pouca comida que roubava, aprendeu a recolher todo o tipo de objectos e, em situações críticas, recorria a vários pequenos truques. Quando chegou a Dongbei, foi enviado de novo para casa e aparentemente nunca mais repetiu a experiência.

Não costumo acreditar em casualidades, e aqui especialmente todos os três trabalhos que Li Mei escolheu do repertório de Peng Xiangjie abordam povos nómadas e experiências. Nesse sentido, a série “Circo” é talvez a mais explícita, mas mesmo a “Colheita de algodão”, em Xinjiang, e “Crianças vendem flores” estão relacionadas com pessoas que abandonaram a segurança do lar e se distanciaram dos hábitos do dia-a-dia.

Sinto que o tema do “Circo” é o mais forte e invulgar: muitos fotógrafos chineses têm feito imagens de vários espectáculos nas zonas rurais, mas poucos seguiram um grupo de forma tão exaustiva como Peng o fez. Nas suas palavras, ele aprendeu com o “professor” Hou Dengke a dedicar-se rigorosamente a um tema, olhando para todos os aspectos que o envolvem. E não só. Por exemplo, além de acompanhar um grupo específico durante as digressões, ele ainda visitou várias aldeias de onde são originários os elementos das trupes com quem trabalhou, de forma a entender a sua história.

Sempre que inicia uma “missão”, Peng, determinado e teimoso, quer ir ao fundo da questão. Eu, pessoalmente – e estou certa de que também os leitores – estou agradecida por ser apresentada uma visão profunda destas manifestações sociais, que, estando em constante “movimento” e “flutuação”, de outra forma não seriam facilmente conhecidas. Dito isto, o que me atrai nas fotos de Peng Xiangjie não é propriamente o trabalho duro que está por trás, nem a abordagem sociológica, a originalidade ou exotismo dos temas. Gosto deles porque me comovem, porque têm uma qualidade poética, a qual tenho de admitir, colocam em várias ocasiões o “aluno” num lugar superior ao do “mestre”. Esta qualidade “poética”, que aqui é puramente visual, não pode ser traduzida na linguagem verbal. Por isso, não vou descrever as imagens, que têm a capacidade de falar por si.

Além disso, o autor conseguiu salientar o traço mais importante destes três temas. As fotos da trupe nómada – o circo – têm um ritmo que combina bem com a actividade frenética deste grupo de exuberantes jovens e pessoas. A compleição atlética dos corpos, a rapidez de movimentos, mesmo o traço exagerado dos rostos – com a forte maquilhagem parecem máscaras – são capturadas com leveza e uma mão “dançante”.

Um ritmo que é feito – como uma metáfora da vida, da melancolia e pesar, seguida de uma gargalhada súbita – da exigência do ensaio diário, intercalado por momentos despreocupados de esquecimento, quando, por exemplo, tomam uma refeição atrás do camião, ou quando acordam ao ar livre, depois de uma noite passada sob das estrelas …