Nova série de caracteres representa fenómenos e objectos da natureza
Luís Ortet
As duas primeiras séries de caracteres que até agora analisámos nesta secção tinham a ver com representações pictográficas relacionadas com a figura humana e com órgãos e partes do corpo humano. Esta terceira série agrupa dez caracteres que têm a ver com a representação pictográfica de fenómenos (e objectos) da natureza.
Isso incluindo por exemplo os caracteres que representam o “sol” 日 e a “lua” 月, mas também os que significam o “metal” (ou “ouro”) 金, a “madeira” (ou “árvore”) 木, a “água” 水, o “fogo” 火 e a “terra” 土.
Estes últimos são os famosos cinco “elementos” (já agora, “elementos” é uma tradução grosseiramente incorrecta, como veremos mais à frente) da filosofia tradicional chinesa. Os cinco “elementos” são de facto os cinco princípios subjacentes a todos os fenómenos da natureza.
Na língua chinesa designa-se esses cinco princípios como wǔxíng 五行, que muitos chineses preferem traduzir, e bem, como “cinco fases”, uma vez que o carácter xíng 行 significa basicamente “andar” ou “fazer” (ou, quando muito, “acontecer”), tudo menos qualquer coisa que se assemelhe a unidades constitutivas da matéria.
Wǔxíng 五行 deriva dos princípios yin (a obscuridade, o frio, a passividade) e yang (a luz, o calor e o dinamismo) e do processo dialéctico através do qual esses dois princípios se expressam ciclicamente ao longo das quatro estações do ano. Poder-se-ia dizer que em certa medida a “madeira” (ou melhor, mù 木) é o princípio da Primavera, o “fogo” (huǒ 火), o do Verão, o “metal” (jīn 金), do Outono, a “água” (shuǐ 水), do Inverno, e finalmente a “terra” (tú 土), o elemento neutro que liga todas as estações. Mas na verdade trata-se de um conceito bem mais complexo do que isso.
A incorrecção de traduzir 五行 como “cinco elementos” é antes de mais puramente linguística, já que nada existe no universo semântico do carácter xíng 行 que legitime uma tal opção. O que contudo não impediu que os mais respeitáveis sinólogos e mesmo tradutores tenham, com uma notável “descontracção”, repetido e consolidado ao longo dos tempos essa mesma inverdade, a tal ponto que se hoje alguém disser ou escrever “as cinco fases chinesas”, ninguém percebe a que se está a referir…
A outra componente do erro é claramente cultural e envolve uma projecção etnocêntrica. Ao constatarem que também os chineses falavam em “fogo”, água”, etc, alguns traditori terão precipitadamente concluído que eles teriam seguido o mesmo raciocínio que o de Empédocles e Aristóteles sobre os “quatro elementos” da física clássica. Mas não seguiram…
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