Rota das Letras: Brian Castro, o primeiro escritor chinês na Austrália
Brian Castro senta-se na sala do edifício do Antigo Tribunal, frente a uma dezena de pessoas, e fala da família, de um exílio que o atirou para o isolamento, para uma nova língua. De origem portuguesa, chinesa e inglesa, o escritor, nascido em Hong Kong, foi enviado aos 11 anos para um colégio interno na Austrália, onde estudou, fez universidade, fez-se escritor. O festival literário Rota das Letras trouxe Brian Castro de regresso a Macau, onde passava férias na infância e já não vinha há mais de 25 anos. “É uma espécie de reinvenção da China”, diz sobre a cidade.
Brian Castro, o escritor
Penso que todo o meu ser se formou com base nessa ideia do isolamento e de uma nova língua. Adoraria falar português e ter outra ferramenta, outra língua. Faço-o com o francês, mas não ao nível literário.
A escrita
É-se cego quando se escreve. Se estiveres consciente de tudo o que está à tua volta, estás a escrever história.
A literatura chinesa
Sigo de vez em quando. O prémio Nobel, Mo Yan, que conheci em Pequim, é muito interessante. Mas sinto que escreve de forma shakespeariana, não é algo que apareça do nada, saído de uma vila chinesa – o que é típico chinês – mas está ligado a outras literaturas. É isso que mais admiro. Penso que a nacionalidade e a literatura não combinam. Claro que há sempre a questão da língua.
Primeiro autor chinês na Austrália, segundo imprensa daquele país
Senti-me lisonjeado, porque deixo uma marca. Mas também senti: Não sou totalmente chinês, sou outras coisas. Mas tudo bem, pelo menos é um reconhecimento. É-me automaticamente atribuído o rótulo de ABC (Australian Born Chinese), é o que pensam que eu sou. Na altura disse, eu não sou um ABC.
Macau e o festival literário
Olho para Macau como se estivesse a renascer e essa renovação acontece em três línguas. A preservação da língua [português] é muito importante, mas deve acontecer em conjunto com o chinês e o inglês. Este festival, por exemplo, o que eu vejo é seriedade nessa renovação. A literatura aqui em Macau e aquela que vem de Portugal e de outros lugares está a ser levada a sério e estou muito surpreendido com isso. Na maior parte dos festivais a que vou roda tudo à volta do jornalismo, das vendas, da divulgação de marcas. Não está a acontecer aqui, o que é fascinante.
Fisionomia da cidade
Olho para Macau como uma espécie de reinvenção da China. Quanto aos casinos, é isso que gera dinheiro e dá trabalho. Sempre defendi que as coisas verdadeiras e com valor histórico necessitam de protecção. Não estou a tentar dar início a qualquer polémica, mas o melhor que se está a passar em Macau é o facto de ser património mundial. É esse tipo de luta que faz sentido.
Brian Castro é autor de onze romances e de um conjunto de ensaios. Foi galardoado com o Patrick White Award for Literature 2014 pela contribuição para a literatura na Austrália. Com Shanghai Dancing, publicado em 2003, venceu o Victorian Premier’s Award for Fiction e o Christina Stead Fiction Prize. O último romance, Blindness and Rage, vai ser publicado pela Giramondo já em Abril deste ano. Actualmente chefia o departamento de Escrita Criativa da Universidade e Adelaide.
Mais sobre a obra e vida de Brian Castro
Foto de destaque: Eduardo Martins/ Festival Literário de Macau